27 de abril de 2010

Primeira última chance


Carolina estava ainda mais destrutiva agora, ainda mais destruída. Porque de alguma forma não haviam mais esperanças, nem para ela e nem para Arthur. Não por enquanto. E enquanto esse momento fosse tangível e crítico, ela não sentia mais vontade de lutar nem se debater, muito menos forças para correr atrás de qualquer coisa. Então ela tentara de tudo: bares, teatros, cinemas, amigos, mas nada conseguia suprir sua necessidade tão fortemente enraigada. Sua ultima tentativa era uma cartela com 16 comprimidos que juram que fará bem. Trarão uma alegria forte e plastificada, mas ela tem certeza de que é muito melhor do que apenas rir de leve para o que tiver muita graça e muito melhor do que gritar com o que não de der para aguentar.

Matheus Oliveira

25 de abril de 2010

Abro a porta e já estou com uma perna pra fora quando ouço, sem nenhuma aflição por mim, apenas consciência de que não teríamos mais notícias um do outro: te cuida. Me cuidei. Só chorei quando já estava dentro do elevador.

Martha Medeiros
Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Meu coração sangra com uma dor que não consigo comunicar a ninguém, recuso todos os toques e ignoro todas tentativas de aproximação. Tenho vergonha de gritar que esta dor é só minha, de pedir que me deixem em paz e só com ela, como um cão com seu osso.

Caio Fernando Abreu
Porque, quando você está com medo da vida, é na minha mania de rir de tudo que você encontra forças. E, quando você está rindo de tudo, é na minha neurose que encontra um pouco de chão. E, quando precisa se sentir especial e amado, é pra mim que você liga. E, quando está longe de casa gosta de ouvir minha voz pra se sentir perto de você. E, quando pensa em alguém em algum momento de solidão, seja para chorar ou para ter algum pensamento mais safado, é em mim que você pensa. Eu sei de tudo.

Tati Bernardi
Mas aí, daqui uns dias.... você vai me ligar. Querendo tomar aquele café de sempre, querendo me esconder como sempre, querendo me amar só enquanto você pode vulgarizar esse amor. Me querendo no escuro. E eu vou topar. Não porque seja uma idiota, não me dê valor ou não tenha nada melhor pra fazer. Apenas porque você me lembra o mistério da vida. Simplesmente porque é assim que a gente faz com a nossa própria existência: não entendemos nada, mas continuamos insistindo.


Tati Bernardi

Let me dream about you


Carolina tinha as duas mãos presas e andava em circulos, vendada. Ela ouvia outros passos, mas ela não conseguia identificar quantos, nem onde estava, quem estava com ela ou porque ela estava ali. Ela só sentia esse cheiro muito forte de amaciante, que ela reconheceria em qualquer lugar. Arthur estava com ela, e em seu pensamento, para ela estava tudo bem assim. Até que a venda caiu e ela pode ver claramente. Eram centenas de pessoas, homens e mulheres, todos sem rostos andando nus ao seu lado, e assim como ela, estavam amarrados. Sobre eles, Arthur estava ali, olhando todos. Totalmente duro, totalmente imovel. Seus olhos se mexiam sim, e quando olhavam para alguém, essa pessoa simplesmente caia e ficava inerte no meio do circulo grande. Carolina sabia que sua hora chegaria, mas não conseguia parar de andar: todos andavam por medo de morrer, com medo de morrer. Ela estava sonhando, mas do lado de fora do corpo, as pessoas podiam ouvir ela falando basta você querer, eu quero tanto.


Matheus Oliveira

23 de abril de 2010

Como se fossem facas


Carolina sentiu que pontas muito fortes e grandes e afiadas entrarem em seu peito, ao mesmo tempo. De alguma forma, ela foi reduzinho de tamanho, até poder ser pequena o bastante para não ser notada, e poder assim, passar chorando por uma multidão de carros. Ao mesmo tempo em que diminuia, Carolina cresceu o suficiente para sentir a dor do mundo inteiro, sentia cada desespero calado sentando em seu peito, tomando algumas horas só para deixar o que era ruim, pior. Ela não imaginava que sua vida fosse chegar a esse ponto, onde ficar sentada no escuro sem pensar em nada fosse o máximo que sua inteligencia era capaz de chegar. Ela queria fugir dali, ela queria voltar no tempo onde em algum lugar não tão distante, alguma coisa se perdeu.

Matheus Oliveira

18 de abril de 2010

Mais um pouco


Ela ria, e ria, e ria e Barbara era a unica que podia consentir esse sentimento sem julgar que Carolina estava ficando louca ou pertubada. Agora Carolina estava feliz
- Isso é amor, Carol!
- Não é amor. E se é, é um amor impossivel, não é reciproco, é platonico. Ele está lá, se divertindo, só eu estou assim, boba por ele.
- Isso é amor, Carolina. E ele sente o mesmo - disse ela pela segunda vez. Era incrivel como Bárbara tinha essa sensitividade, essa inspiração para dizer o que sentia, para sentir o que dizia, essa calma no meio do caos.
- Não é amor, Barbara, para. De certa forma, eu só gostei de me ver como ele via, de achar que eu tenho o valor que ele me deu. Eu só me sinto muito bem ao lado dele, e confio nele, e quando estou perto dele, sinto que minha alma quer sair pelos poros. Mas não é amor, amor, é bobeira de pós-adolescente!
- Isso é amor, minha querida - Ela disse pela terceira vez

Matheus Oliveira

A sala de espera


Era como se os dois estivessem em uma sala de espera, aguardando um olhar mutuo, um sinal qualquer ou uma partida. Carolina estava num estado no qual ela nunca havia estado antes. Não havia dor, nem timidez, nem medo e nem vergonha. Ela estava ali do lado de Arthur e isso bastava. Não importava o que tinha acontecido no passado de cada um deles, não importa que eles tivessem se conhecido em período tão ruim e não importa o que viria a seguir, ali, do lado de Arthur, Carolina só conseguia sentir essa imensa proteção, como se nada de ruim pudesse atingi-la. Eles não sonhavam, nem sabiam, mas ainda haveria muitas coisas por vir: eles se reergueriam como duas grandes fênix, juntos, e logo após isso, haveria a grande separação. E se encontrariam e viveriam um para o outro, até que houvesse outro golpe do destino e os dois caissem juntos na mesma sala de espera.


Matheus Oliveira

9 de abril de 2010

Eu acredito que tudo acontece por uma razão. As pessoas mudam afim de que você possa aprender a deixar pra lá. As coisas correm mal, para que você possa apreciá-las quando estão boas. Você acredita menos, assim você eventualmente aprende a não confiar em ninguém a não ser você mesmo. E às vezes, coisas boas acabam, para que coisas melhores possam começar.

Marilyn Monroe, adaptado.
Eu tenho vontade de jogar meu celular numa parede qualquer. E me libertar da vontade de ouvir sua voz.

Tati Bernardi
Parece-me agora, tanto tempo depois, que as partidas-dolorosas, as amargas- separações, as perdas-irreparáveis costumam lavrar assim o rosto dos que ficam. E do buraco negro da memória que ocupa agora o espaço anteriormente ocupado por essa pessoa — sim, era uma pessoa que não lembro —, em vez de faces, jeitos, vozes, nomes, cheiros, formas, chegam-me somente emoções confusa ou palavras como estas — doloroso, amargo, irreparável.

Caio Fernando Abreu
Gosto de permanecer ali na sala em raros dias iluminados, sobretudo ao cair da tarde, quando os últimos raios de sol varam os vidros para espalhar cores sobre os objetos. São muitos objetos, tantos que freqüentemente penso que daqui a algum tempo será difícil movimentar-me aqui dentro, no espaço que se reduz, quase todos feitos por mim mesmo.

Caio Fernando Abreu

8 de abril de 2010

O garoto com cheiro de amaciante


Final de dezembro, festas de fim de ano, o mundo estava brilhando na sua agitação de cidade grande. As luzes piscavam, as pessoas se sacudiam como se aquele fosse o ultimo momento de suas vidas, todas gritando e dançando felizes. Enquanto isso, Carolina, que não se misturava a sujeira alheia pois acreditava ter sua própria fonte infinita de lixo, estava debruçada sobre a janela do apartamento tumultuado, olhando a rua que, aos poucos, começava a encher. O garoto de calça apertada e cheiro de amaciante se aproximou e ela nem notou. Ficou ao seu lado, suspirou algumas vezes
- Arthur - disse baixinho
- Não, Carolina.
- Meu nome é Arthur
- Ah, entendi
Enquanto isso, na festa, tocava uma música calma, coisas de casais apaixonados e pessoas vulgares que não aguentam ficar sozinhas ou dançar sozinhas ou pensarem sozinhas, pensou Carolina. Oceans apart day after day, and i slowly going insane, i hear your voice in telephone but it doesn't stop the pain
- Você nunca se liga a alguém porque é complicado ou é simples e depois piora?
- Para mim é complicado
- Para mim piora
Whatever you go, whatever you do, a musica era clichê mas exercia o poder de deixar o clima promissor
- Olha, a musica é lenta, porque não vem dançar comigo e facilita as coisas para gente?
- Não
- Você não sabe dançar?
- Sei
- Então por que não?
- Porque não
E Carolina não sabia, nem sonhava que aquele garoto de calça apertada e um cheiro demasiado forte de amaciante teria num futuro muito proximo uma importancia enorme, imensa na sua vida.


Matheus Oliveira

6 de abril de 2010

O cemitério

Nesses dez segundos Carolina foi capaz de entender o acidente dos pais, as quedas que havia caido, os romances destruidos e as amizades fracas. Coisas assim acontecem e pronto, assim era a vida e ponto. Ela se lembrou de que não era culpada por nada disso e que, talvez, os outros também não sejam. Nesses dez segundos, Carolina se viu visitando o proprio cemitério, com amigos, parentes e amores mortos e enterrados. Chegou a conclusão de que nunca fora tão plena de tudo, tão limpa de alma: todos os que haviam ido embora haviam deixado para trás todas as quinquilharias possiveis, mas pelo menos haviam ido embora. Carolina vira e mexe desenterra algum momento, só para ter certeza de que foi a escolha certa ter enterrado todos eles. E sempre tem, afinal é muito dificil enterrar tantos fantasmas, mas ela não estava disposta a viver mal assombrada para o resto de sua vida.

Matheus Oliveira

4 de abril de 2010

Atestado de Óbito




Carolina passou a procurar nos jornais atestados de óbitos, pois somente uma morte inesperada agora traria alguma resposta. Arthur havia sumido e isso não era uma hipérbole. Nenhum endereço, carta, aviso, bilhete, telefonema, nada. Ele não havia deixado nara para trás. E como Carolina poderia agora ser forte e prosseguir? Ela poderia achar que era culpa dela, mas ela sabia que não havia feito nada de errado dessa vez. E embora não fosse a primeira vez que Arthur tivesse feito isso, Carolina ainda esperava por ele. E esperava só por ele, não procurava mais motivos e nem respostas, só o fato de que ele sempre voltava a ela era o suficiente. Ela sabia que, acima de tudo, o amava burra. Nenhum mundo aonde ele fosse tinha o poder de a atingir permanentemente, nenhuma loucura que ele cometesse tinha o poder de a afastar dele. E ela sentia que de alguma forma precisava de um tratamento para isso, pois tanto amor dava medo de infartar na rua.
Nas vezes anteriores, Carolina acreditou que ainda havia muito tempo para se consertar as coisas e que um dia, não muito distante, haveria a tão esperada paz entre eles. Ainda era cedo e, enquanto fosse cedo, Carolina sonhava. Mas agora, finalmente estava ficando tarde demais.


Matheus Oliveira